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Com transposição em marcha lenta, Geddel compensa NE com 'bondades'

OESP, Nacional, p. A4
29 de Abr de 2007

Com transposição em marcha lenta, Geddel compensa NE com 'bondades'
Programas de irrigação e para levar água a carentes devem custar quase 80% do valor das obras no São Francisco

Luciana Nunes Leal

Imprensado entre a burocracia e a briga política, o projeto de transposição do Rio São Francisco, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva gostaria de deixar como marca de seu segundo mandato, deu lugar, até agora, a uma série de "bondades" distribuídas entre os Estados nordestinos. Enquanto o Ministério da Integração Nacional não desata o nó que impede o início das obras da transposição, um investimento de R$ 6,6 bilhões, o governo promete outras ações que, somadas, chegarão a 79% desse valor - R$ 5,2 bilhões.

Se forem tiradas do papel, ou melhor, do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), essas obras vão contemplar, até 2010, Estados favoráveis e contrários à transposição. No pacote nordestino estão desde os R$ 269 milhões do Proágua, que construirá canais para levar água do próprio São Francisco para comunidades próximas ao rio, até um ambicioso projeto de irrigação que soma R$ 2,7 bilhões, a serem distribuídos entre Alagoas, Sergipe, Bahia (contrários à transposição), Paraíba, Ceará, Pernambuco (favoráveis à obra) e Piauí.

Pressionado por todos os lados, o ministro Geddel Vieira Lima - deputado do PMDB baiano que luta para provar que, ao contrário de seus conterrâneos, é a favor da transposição do São Francisco - tenta compensar as reclamações com a promessa de implementação dos outros programas. "Há de se reconhecer um argumento sério restritivo à transposição: como levar água a 220 quilômetros, a 400 quilômetros do Rio São Francisco e deixar comunidades à beira do rio, a 3 ou 4 quilômetros de distância, sem água? Daí surgiu a idéia do Água Para Todos (Proágua), que sensibilizou muito o presidente Lula", disse Geddel há duas semanas, em uma audiência pública na Câmara.

Nesse mesmo encontro, Geddel surpreendeu a platéia ao revelar que as obras da transposição não vão começar antes de outubro, por causa da lentidão do processo de licitação. "Os documentos serão recebidos em maio", disse, referindo-se às propostas das empresas concorrentes. "Para uma licitação desse tamanho, precisa de algo em torno de 90 dias para que todos os procedimentos legais sejam implementados. Está marcado para o final do ano, ou meados do segundo semestre, nós darmos início às obras civis", calculou Geddel.

O deputado oposicionista José Carlos Machado (DEM-SE), um dos mais atuantes na luta contra a transposição, já duvida que a obra vá ser executada. "Acredito que o Água Para Todos é muito mais racional, porque vai atender a população que está perto do rio e não tem água para beber. É preciso primeiro atender às demandas da bacia do São Francisco e não falar em transposição, um projeto megalômano. Mas o vacilo do governo me tranqüiliza, eu não acredito que essa obra vai sair", afirma Machado. "O próprio ministro Geddel está vacilante em relação à obra. No máximo, acho que sairá o eixo leste, que vejo até com simpatia, porque levará água à Paraíba, que realmente precisa."

COBRANÇAS

Entre os governistas, vêm do PSB as maiores cobranças pelo início da obra. O partido teve os dois ministros da Integração Nacional anteriores, primeiro o deputado Ciro Gomes (CE) e depois seu secretário-executivo, Pedro Britto, que comandará a futura Secretaria de Portos. Ciro prefere a diplomacia e diz que é preciso dar um crédito a Geddel "porque o ministro está chegando". Os aliados do ex-ministro, no entanto, são categóricos em dizer que as obras já poderiam ter começado, tocadas pelo Batalhão de Engenharia do Exército enquanto a licitação não é concluída.

Geddel se irrita com as insinuações de que não tem se empenhado para dar início à obra. "Não estou protelando nada", garantiu aos deputados. Em seguida, fez uma crítica sutil aos antecessores. "Se fosse eu que tivesse tomado conta do projeto desde o início, o debate teria sido travado em outra seara que não a da emoção", disse.

O fato é que o presidente Lula não conseguiu ver a transposição avançar no primeiro mandato e até agora só tem ouvido previsões que não se concretizam para o início das obras. Geddel diz que preferiu ser realista a prometer uma data que não poderia cumprir.

O deputado Marcondes Gadelha (PSB-PB), um dos maiores defensores do projeto, discorda. "Se o governo deixar para o fim do ano, a transposição vai virar ficção. Será mortal para ela. Se as obras começarem, torna-se fato, não tem como voltar atrás. Se demorarem, haverá mais espaço para os que são contra se organizarem", argumenta. "Como diz meu irmão, há quem não goste de gente, só de bicho. A transposição vai beneficiar 12 milhões de pessoas e demora tanto para sair. Se fosse beneficiar 12 milhões de jacarés já estava pronta."

Exército diz que pode iniciar obra com R$ 89 milhões

O governo federal editou, na semana ada, a Medida Provisória 364 que destina R$ 89 milhões para a transposição do Rio São Francisco. Embora seja uma quantia mínima diante do custo total de R$ 6,6 bilhões, os defensores do início imediato das obras dizem que a verba é suficiente para o Exército começar os trabalhos. O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, tem argumentado que faltam recursos para rear ao Exército e iniciar as obras.

Em resposta às perguntas do Estado, o Centro de Comunicação Social do Exército disse que "o 2.o e o 3.o Batalhões de Engenharia de Construção aguardam a aprovação do plano de trabalho, a alocação de recursos e a ordem de serviços para iniciar a mobilização para a região de Cabrobó e Floresta", onde começarão as obras dos eixos leste e norte. Segundo o Centro de Comunicação, há condições de iniciar as obras assim que o Ministério da Integração der sinal verde.

Até a noite de sexta-feira, o Estado não havia conseguido ouvir Geddel sobre as pendências do projeto. Aliás, como prefere o governo, o Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional. "Mudamos a denominação porque a palavra transposição deu a impressão de que haveria um desvio do rio", explicou o técnico da Integração Nacional Rômulo Macedo, encarregado de detalhar o projeto em audiência na Câmara.

OESP, 29/04/2007, Nacional, p. A4

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