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Preocupa que setor biotecnológico seja tão concentrado

FSP, Ciência+Saúde, p. B8
Autor: LOPES, Maurício Antônio
04 de Abr de 2015

Preocupa que setor biotecnológico seja tão concentrado

Entrevista Maurício Antônio Lopes
PRESIDENTE DA EMBRAPA DEFENDE SEMENTES DE "CÓDIGO ABERTO", OU SEJA, SEM ROYALTIES
SOFIA FERNANDES DE BRASÍLIA

O presidente da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), Maurício Antônio Lopes, está preocupado com a excessiva concentração do mercado brasileiro de biotecnologia.
Ele acredita em novos modelos para a venda de sementes aos produtores rurais --segundo ele, a Embrapa deve investir na produção de sementes de "código aberto", ou seja, que sejam vendidas sem a cobrança de royalties, em oposição à política das multinacionais que dominam o mercado de transgênicos no país (leia mais à direita).
Leia a seguir trechos de sua entrevista à Folha.
FOLHA - Como a Embrapa pode ajudar o país a lidar com grandes secas?
Maurício Antônio Lopes - Estamos incorporando tecnologias que vão tornar nossa agricultura mais capaz de ar essas mudanças de disponibilidade de água.
Por exemplo: plantas com ciclos mais curtos. Uma soja que demora 150 dias entre o plantio e a colheita, por exemplo, está submetida a um risco muito maior num período tão longo, em que pode ter um evento climático que afete a produtividade.
Há tendência muito forte na agricultura de produzir com um ciclo mais curto. A gente faz isso usando melhoramento genético para incorporar essa característica às plantas. Isso já é realidade para a soja, o milho, o algodão, o feijão.
Produtos geneticamente modificados serão uma resposta cada vez mais presente?
Grande parte das soluções que virão vão ar por aí.
Essas novas tecnologias não acabam sendo mais restritas e caras para os produtores?
Quem faz esse trabalho de genética e melhoramento somos nós [a Embrapa] e as grandes empresas.
Com o advento da biotecnologia [que incorpora técnicas de recombinação do DNA das plantas], há uma tendência muito forte de concentração desse trabalho, caro e complexo, em poucos atores.
No ado, a gente fazia seleção [das plantas], levava a campo, testava, era um processo mais longo. A gente tinha um número maior de empresas, não demandava uma tecnologia tão cara e sofisticada. Com a introdução da biotecnologia, a gente teve uma ruptura, é uma mudança tecnológica drástica.
Preocupa a concentração?
Há sim uma preocupação pelo fato de que a gente tende a caminhar para uma realidade de poucos provedores dessas tecnologias, sendo que o melhor seria evitar o risco de concentração excessiva de poder econômico e de mercado na mão de poucas empresas.
O Brasil é muito grande, muito plural, as nossas realidades exigem uma diversidade maior de opções no mercado e é importantíssimo que o setor público de pesquisa estimule essa diversidade. Com linhas de crédito a custos menores, estímulos para novas empresas de semente, e que as sementes desenvolvidas em ambiente público fluam melhor para os agricultores.
Há alguma política em estudo?
É importante dizer que trabalhamos com todas as empresas. Não estou aqui estimulando ninguém a combater as empresas de biotecnologia. Acho que elas estão no papel delas, dão grande contribuição, fazem grande investimento em pesquisa.
Somos críticos é a uma lógica de concentração muito excessiva no mercado. O setor público pode ser elemento importante de diversificação e oferta maior de soluções. Estamos discutindo um programa neste momento de sementes de código aberto. Queremos distribuir genética a um preço muito baixo para estimular negócios.
Como será esse programa?
Queremos encontrar caminhos para tornar cada vez mais disponíveis sementes desenvolvidas em ambiente público. Muito provavelmente, sementes que a gente desenvolvia e liberava para o mercado numa lógica de código fechado, a gente vai poder ar para uma lógica de código aberto, sem cobrar royalties, apenas o custo de multiplicação da semente.

Raio-X Maurício Antônio Lopes

Idade
54 anos

Formação
Agrônomo com mestrado em Genética pela Purdue University (EUA) e doutorado em Genética Molecular pela University of Arizona (EUA)

Experiência
Está na Embrapa desde 1989, onde já chefiou o Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento

saiba Mais
Mercado de transgênicos não é da Embrapa

RICARDO MIOTO EDITOR DE "CIÊNCIA" E "SAÚDE"

Tão polêmicas, as plantas geneticamente modificadas ganharam o Brasil.

Hoje, mais de 80% do milho plantado no país é transgênico. No caso da soja, o valor ultraa 90%.

Nesse novo mundo da biotecnologia no campo --há dez anos, nem sequer existia milho transgênico aprovado no país--, a Embrapa fica bem atrás das grandes multinacionais em número de produtos.

A campeã é a Monsanto. Das 39 plantas geneticamente modificadas aprovadas para o comércio pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, 16 são dela. A Bayer tem nove registros.

A Embrapa tem dois registros. Um de soja tolerante a herbicidas (com a Basf) e um feijão resistente a um vírus que ataca feijoeiros.

Por mais que se afirme que os produtores ficam reféns das multinacionais ao aderir aos transgênicos --am a ter de pagar royalties pelas sementes--, é difícil negar o salto de produtividade. Na safra 2006/2007, o país produzia 3.600 kg por hectare de milho. Em 2013/2014, mais de 5.000 kg.

Na soja, esse valor foi de 2,300 kg em 1997/98, quando veio a semente Roundup Ready, da Monsanto, para 3.000 kg por hectare.

Embora não se possa atribuir tudo às sementes modificadas, vários especialistas, como o professor da FGV Roberto Rodrigues, apontam que não teria sido possível sem elas.

FSP, 04/04/2015, Ciência+Saúde, p. B8

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/214579-preocupa-que-setor…

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/214582-raio-x-mauricio-an…

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cienciasaude/214580-mercado-de-transge…

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